ELEITOS DO POVO - E OPRIMEM, MATAM
Sobrevivemos e é esta a maldição - vivemos um tempo de horror e desumanização.
Fascismo sem rosto servido por marionetas com sorriso de plástico que escorrem sangue dos dentes. E apregoam a caridade, a caridade dos ricos - a humilhação dos pobres.
E cercam-nos, cercam-nos com a sua crueldade enquanto na vanidade e mentira consumam os seus crimes.
Escroques, crápulas ao serviço do dinheiro sem rosto, dizem que são ministros, dizem que são eleitos, representantes do povo - e oprimem, matam, lentamente matam à fome, na solidão e doença matam.
Com o desemprego matam, com a indigência matam.
Dizem que são ministros, eleitos, mas são assassinos.
ERA MEU AMIGO
mas é uma vergonha está bêbado e já não liga a nada
outro dia até foi apanhado a roubar
tudo histórias tristes dizem por isso a mulher já lhe pôs os cornos
era delegado sindical e depois da última greve foi despedido
os tribunais
estava à espera
há um ano há dois há três há muitos
a casa hipotecada
e todos os dias discussões com a família
no banco
os presados funcionários afirmaram ameaçou-nos
o juiz olhou longamente o seu rosto devastado de bêbado
e depois de um pesado silêncio
com voz pausada disse -- um ano de prisão
EMIGRANTES
a ela levaram-na para uma casa de putas
a ele ameaçaram-no que se não estivesse calado e quieto
o denunciariam
não percebem a língua
do país onde estão
vivem longe um do outro
ele debaixo da ponte onde dorme e vê
as águas do rio correr
debruça-se e já não reconhece o seu próprio rosto
ela amordaçado o coração mudado o nome
deixa que a memória se apague
o paraíso que sonharam
é agora o inferno das suas vidas
emigrados na selva da grande cidade
não existem
OS SENHORES DA GUERRA
um cartaz colado na parede por um homem inconformado
tu lês desde há cinco anos centenas de milhares
de mortos na guerra do Iraque
crianças
o seu rosto de espanto para sempre fechado
acusando o mundo
mulheres a face aberta num grito
farrapos já sem vida
as casas em ruinas
só paredes esburacadas
e por entre os destroços os cães farejam
e nas esquinas as espingardas dos soldados apontadas
ruinas ruinas mortes
e no jornal sorrindo o primeiro ministro português Durão Barroso
ao lado do Bush americano
o Blair inglês
e o espanhol Aznar
e tu olhas e a fotografia cresce cresce
e crescem aqueles rostos sorrindo
são um grande balão um monstruoso balão
cheio de sangue sobre o mundo
ameaça-nos
(do livro Corpo de Compromisso)