terça-feira, 4 de março de 2014

 CAMARDAS EXEMPLARES

É noite, é escuro, ouves  o latir do coração do mundo....
Ouves o respirar do caudal do rio humano nos corredores do tempo...
Ouves e ouves e olhas as cintilações, nomes que se formam no ar, nomes que não se apagaram: nos iluminam - Álvaro Cunhal, Mário Castrim, Francisco Miguel
 Lentamente sílabas esses nomes, esses nomes lanternas, lâmpadas, esses nomes faróis...
E vê-los tão nitidamente!
Eles são os camaradas exemplares. 
Tão presentes nas nossas opções, nas nossas consciência,  na nossa militância, ...
Porque pertencem ao número das pessoas que o tempo torna cada vez mais vivas, cada vez mais nítidas .
Por isso, com eles ao nosso lado, pedimos à vida força e coragem, para continuarmos a lutar.
E vemo-los a sorrir.


ÁLVARO CUNHAL

eis as cintilações     e nas solidões imaginas o rosto
dum ideal humano

foram prisões   muros   torturas
noite dentro   persistentemente  transportando
a fidelidade
à humana felicidade

lavrador de palavras novas
camarada    liberdade   socialismo
revolução  
sorria enquanto o frio a fome
e o cansaço
o cercavam nos seus laços

persistia iluminando o tempo


MÁRIO CASTRIM

eu era jovem

e ele      um oficiante das palavras
ensinando-me generosamente o ofício

trabalho esse     lento    lento    dádiva
paciência

anos e anos
e ele    as palavras    as palavras
os poemas    olha à tua volta
e deixa que essa verdade esse pássaro
voe em liberdade desde o mais fundo de ti

era isto ou não era bem assim
era uma atenção humana    tão humana
ao barro
ao suor do barro que eu era em construção


FRANCISCO MIGUEL

lembras-te dele    um sorriso iluminando-lhe
o rosto

a sua história
de lutas   sacrifícios    coragem
podia encher páginas e páginas
de épica humanidade

ainda criança trabalhou no campo
depois foi sapateiro
esteve em Espanha

e então o amor humano
carregou-o aos ombros
e fez da sua vida
uma luta pelos oprimidos

foi preso torturado
evadiu-se
conheceu as piores masmorras
mas nunca foi vencido

e ele olha-me sorrindo
pousa leve a mão sobre o meu ombro
golo a golo junto ao balcão
saboreia um copo de vinho e diz-me - então, e tu?